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quarta-feira, 7 de agosto de 2013

O SELO DE DEUS E A MARCA DA BESTA


O quadro acima foi a transformação de outro violentamente provocativo contra a IGREJA CATÓLICA, no qual os adventistas defendem o retorno ao sábado judeu em detrimento do dia do Senhor que é o Domingo em desobediência à única e verdadeira fé deixada por Cristo com a ordem de ensinar todas as nações. Ele mandou à Igreja que ensinasse e aquele que não cresse seria condenado. Com o selo de cor negra acusavam-nos de adorar o deus sol pagão. Neste caso, já que falava em sol nada mais justo que nos lembrar do SOL DA MANHÃ, Jesus, a luz resplandescente  que, em seu corpo, que é a IGREJA, ilumina todas as nações. Os anticristos são os que saíram dentre nós  (I Jo 2,18) , isto é, os ANTICRISTOS indicados pelo número 666, o número do grande inimigo de Cristo, a besta. 

... os sinais com que Deus chancela a autoridade dos seus enviados são os milagres: milagres que se manifestam na ordem física, milagres que resplendem na santidade irrepreensível do divino enviado. Só o milagre, intervenção extraordinária da divina onipotência, pode autenticar as missões do céu.

Com milagres provou JESUS a sua messianidade; com milagres sigilou Deus a embaixada dos seus apóstolos; no milagre reconheceu sempre a apologética cristã, firmada nos princípios da razão e nos ensinamentos dos livros inspirados, a assinatura inimitável do divino Autor nas suas manifestações extraordinárias à humanidade.

O próprio LUTERO reconheceu a necessidade desta autenticação celeste. Querendo impedir a pregação de TOMÁS MÜNZER em Mulhouse, escreveu em 1524 aos magistrados desta cidade que, se o turbulento inovador não puder provar com obras extraordinárias a sua missão, não o recebam. "Se ele disser que Deus e o seu espírito o enviam como aos apóstolos, que o prove com prodígios e milagres; do contrário, proibi-lhe a pregação"....


MISSÃO RELIGIOSA DE LUTERO - Pg. 173


Livro II 

A Reforma Protestante

Capítulo I - ÓRIGEM E PROGRESSO DA REFORMA
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§ 1. - Missão religiosa de Lutero.




SUMÁRIO - O "profeta de Wittemberga". - Exame de suas credenciais: milagre e profecias. - Perfil de Lutero e dos outros reformadores.





Lutero começou por negar. Negou a autoridade, negou a tradição, negou o magistério eclesiástico, negou a Igreja orgânica, visível e hierárquica. Com que direito? Com que títulos? Não existia havia 15 séculos o cristianismo? Não ascendiam os seus pastores, os seus bispos, os seus papas, por uma sucessão ininterrupta até aos apóstolos, até ao próprio Cristo?

- Mas a Igreja católica havia perdido o espírito primitivo, havia adulterado os ensinamentos do Evangelho, havia-o sobrecarregado com uma farragem de superstições humanas, havia-o prostituído com a idolatria de Babilônia.

- E como o sabe ele? Como o prova? Não havia Cristo prometido a sua assistência infalível à Igreja? Não lhe havia assegurado que com ela estaria todos os dias até à consumação dos séculos?

Não importa: Lutero entrincheira-se na Bíblia. A Escritura será o seu escudo contra todos os adversários. - Mas a Bíbilia, quem a interpreta? Não a possuía, não a possui, porventura a Igreja católica? Não a liam todos os Santos Padres e Doutores? Não a conheciam todos os concílios? Não a vulgarizavam todos os santos reformadores? E por que a nenhum ocorreu a idéia de começar uma reforma destruindo a Igreja em nome da Escritura,


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de embandeirar a Bíblia em pendão de revolta contra a autoridade constituída por Cristo?

Lutero, porém, possui um segredo especial de exegese desconhecido de toda a antiguidade eclesiástica. Ele, o frade despeitado, guinda-se às alturas proféticas de novo evangelista, recebe diretamente ilustrações do Espírito Santo, comunica com o santuário da Trindade1 e dos recessos inacessíveis traz ao mundo o dom de uma hermenêutica sacra, de cujo bojo sai um cristianismo todo novo.

Destarte, de consequência em consequência, Fr. MARTINHO é obrigado a arvorar-se uma missão divina, a atribuir-se uma legação religiosa especial.

Ora, onde estão as credenciais desta embaixada extraordinária? Nenhum homem pode levantar-se no meio dos seus semelhantes e afirmar, sem provas cabais, que é um enviado do Altíssimo. Nenhum homem pode guindar-se à trípode dos oráculos e daí legislar religião para a humanidade sem antes demonstrar apoditicamente a autenticidade de sua missão plenipotenciária. Religião, só Deus a pode impor ao homem. Falar à consciência religiosa, ensinando verdades a crer e preceitos a praticar, sem títulos divinos, sem autorização divina, sem sanção divina, é embuste, é impostura, é charlatanismo. Nossa dignidade de seres racionais revolta-se contra semelhantes exploradores da credulidade pública. - Profeta de Witemberga, onde estão as cartas de crença de tua missão divina?

A garantia que temos da origem celeste de uma doutrina reside na autoridade recebida do alto por aquele que no-la propõe.

Ora, os sinais com que Deus chancela a autoridade dos seus enviados são os milagres: milagres que se manifestam na ordem física, milagres que resplendem na santidade irrepreensível do divino enviado. Só o milagre, intervenção extraordinária da divina onipotência, pode autenticar as missões do céu.

Com milagres provou JESUS a sua messianidade;2 com milagres sigilou Deus a embaixada dos seus apóstolos;3 no milagre reconheceu sempre a apologética cristã, firmada nos princípios da razão e nos ensinamentos dos livros inspirados, a assinatura inimitável
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1. "Certus sum dogmata mea me habere Caelo", Wimar, X, 2 Abt., p. 184.

2. JOAN., V, 36; X, 37-38; XV, 22; MATH., XII, 39-40.

3. 2 PETR., I, 28; 2 Cor., XII, 12; MARC., XVI, 20.


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do divino Autor nas suas manifestações extraordinárias à humanidade.

O próprio LUTERO reconheceu a necessidade desta autenticação celeste. Querendo impedir a pregação de TOMÁS MÜNZER em Mulhouse, escreveu em 1524 aos magistrados desta cidade que, se o turbulento inovador não puder provar com obras extraordinárias a sua missão, não o recebam. "Se ele disser que Deus e o seu espírito o enviam como aos apóstolos, que o prove com prodígios e milagres; do contrário, proibi-lhe a pregação".4

Quando CARLOSTADT, apelando para ilustrações divinas, o contradisse, LUTERO intimou-o a demonstrasr com milagres a sua vocação: "é necessário que Deus manifeste com obras milagrosas que revoga os seus antigos preceitos".5 E alhures? Quem quer pôr em campo alguma novidade ou ensinar doutrinas diversas deve ser chamado por Deus e comprovar a sua vocação com verdadeiras ações prodigiosas. Quem não a puder demonstrar deste modo, abra mão da empresa et in malam rem abeat"6 (e a considere como coisa ruim)

Julgando-o por esta craveira, que milagres fez LUTERO? Que milagres fizeram os primeiros reformadores para atestar o caráter divino de sua missão? De todos os protestantes escreveu gracejando, ERASMO, que até então não haviam endireitado a perna a um cavalo coxo. LUTERO acabou por perceber esta lacuna na sua missão, mas, por um destes truques de sofista em que era useiro e vezeiro, virou de bordo e proclamou o milagre uma inutilidade... Depois, triunfando exclama: "não hão de ver milagres feitos por nós, porque, se os fizéramos, o mundo os havia de atribuir ao diabo"7

E profecias? - Há uma que ocorre frequentamente nos escritos dos primeiros inovadores: a iminente ruína do Papado. LUTERO gostava muito do verso "pestis eram vivens, moriens tua mors ero, papa". Inseriu-o numa carta em 1527; mais tarde, com um pedaço de giz, escreveu-o nas paredes do quarto onde, poucas horas depois, o salteou de improviso a morte. -_________

4. DE WETTE, II, 538; WEIMAR, XV, 240.

5. WEIMAR, XVIII, 95-97

6. WEIMAR, XX. 724

7. eRL., XII, 218-21; XLVI, 205


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Depois de quatro séculos podemos dizer que a esmagadora realidade histórica não abonou os títulos proféticos do vate saxônio.8

Além dos prodígios físicos, que são extrínsecos ao taumaturgo, há outro milagre de ordem moral, que, por assim dizer, se consubstancia com a sua própria pessoa: É A SANTIDADE DE VIDA. Um homem que pode atirar aos seus adversários a luva, dizendo-lhes: quis ex vobis arguit me de peccato(Jo 8,46). Um homem, em cuja veracidade não pode caber a mínima suspeita de impostura, merece lhe prestemos fé. Nesta grandeza moral, superior à fragilidade humana temos uma fiança de que Deus está com ele. SALVAS AS PROPORÇÕES necessárias, o que se diz de Cristo vale de um puro homem que se apresenta na história com uma missão divina.


Ora, deram os primeiros reformadores este espetáculo edificante de santidade? Oh! Se o protestantismo pudera passar um esponja sobre as nódoas que lhe enxovalham as origens vergonhosas! Mas a história não se apaga e a verdade beneficia sempre de suas lições indeléveis.

Pouco a pouco, a despeito de diculdades inauditas, rasgou-se o véu que cobria ao mundo as torpezas e incoerências destas vidas vergonhosas e a posteridade pregou os patriarcas do protestantismo no pelourinho da ignomínia e da execração pública.

Não é meu intuito humilhar aqui os protestantes. Quisera tão somente iluminá-los. Verdades que amargam são muitas vezes verdades que salvam.

LUTERO inaugura a sua missão com o gravíssimo pecado do sacrilégio e da apostasia. Jovem, era livre. Um dia, enamorado do ideal evangélico de perfeição, desejoso de seguir de perto a Cristo, estende espontaneamente a mão sobre o altar e pronuncia os votos religiosos de pobreza, obediência e castidade. Passam os anos. Raia o dia do seu sacerdócio. Ainda uma vez, quando o crisma
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8. Depois de LUTERO, outros protestantes comprometeram os seus créditos de videntes na mesma empresa arriscada. "On sait qu'une maladie du protestantisme aussi ancienne que lui, fut la manie de prédire la chute de la puissanche pontificale. Les erreurs, les bévues, les plus énormes, le ridicule de plus solennel, rien n'a pu le corriger; toujours il est venu à la charge". DE MAISTRE, Du pape, Concluion, Paris-Lyon, 1819, p. 669. Quem tal crera? Também o Sr. C. Pereira não trepida em voltar à carga e ainda uma vez afrontar este "ridicule le plus solennel". O catolicismo é um "colosso de pés de barro", p. 378. E dura há 20 séculos! - "O reindo de Pio IX terá assinalado a data fatal da suprema decadência", p. 379. É o que provam evidentemente os brilhantes pontificados de Leão XIII, Pio X, Bento XV E Pio XI. - "O ídolo do Vaticano será precipitado no seio da história com o ímpeto de uma pedra arremessada no fundo do mar"!, p.25o. E este prognóstico se publica no ano de mil novecentos e vinte do nascimento de N. S. J. C.! - E se a história disser um dia que o vidente de S. Paulo não passa de um visionário vulgar!

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sagrado lhe ungia as mãos, o neolevita renova a consagração do religioso. Mais tarde, que faz LUTERO de todas estas promessas firmadas com a santidade inviolável do juramento? Quebra a fé empenhada, rasga os seus compromissos, atira o burel de religioso às urtigas e enxovalha a candura da estola sacerdotal no lodo de um casamento duplamente sacrílego.

O orgulho fizera o fedífrago, o orgulho cegou o doutor. Na sua auto-suficiência dir-se-ia que se esqueceu não só a humildade evangélica, mas as reservas da modéstia mais elementar. Até ao aparecimento do seu Evangelho ninguém soubera quem era Cristo, que eram os sacramentos, que era a fé, quem era Deus e a sua Igreja.9 Os Santos Padres, os Apóstolos, os Concílio, a Igreja toda errou! Sua doutrina é a única verdadeira. "Muito embora a Igreja, AGOSTINHO e os outros doutores, PEDRO e APOLO e até um anjo do céu ensinem o contrário, minha doutrina é tal que só ela engrandece a graça e a glória de Deus e condena a justiça de todos os homens na sua sabedoria".10 "Qualquer dos seus sequazes, as crianças que estudaram os seus ensinamentos, sabem mais em matéria de religião e de cristianismo que todos os religiosos e todas as escolas católicas."11 - Que demência de soberba!

Mais ao vivo ainda se revela o frenesi desta inteligência decaída, nestas palavras que não têm semelhantes nos fastos do despotismo e do orgulho humano. "Quem não crê como eu é destinado ao inferno. Minha doutrina e a doutrina de Deus são a mesma coisa. Meu juízo é o juízo de Deus".12 "Tenho certeza que meus dogmas vêm do céu... eles hão de prevalecer e o Papa há de cair a despeito de todas as portas de inferno, a despeito de todos os poderes dos ares, da terra e do mar".13 "Não devemos ceder aos ímpios papistas... Nossa soberba contra o Papa é necessária... Não havemos de ceder nem a todos os anjos do céu, nem a Pedro, nem a Paulo, nem a cem imperadores, nem a mil Papas, nem, a todo o mundo... a ninguém cedo nulli".14 "Este LUTERO não vos parece uma homem extravagante? Quanto a mim, penso que ele é Deus. Senão, como teriam os seus escritos e o seu nome a potência_________

9. Weimar, XXX, 3 Abteilung, 317.

10. Weimar, XI, 1 Abt, 132.

11. DE WETTE, IV, 21.

12. Weimar, X, 2 Abt., 107

13. Weimar, X, 1 Abt., 184.

14. Weimar, XV, 1 Abt., 180-1


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de transformar mendigos em senhores, asnos em doutores, falsários em santos, lodo em perolas!"15 Orgia do orgulho satânico ou caso de patologia mental?

Não é pois de maravilhar que este homem assim enfatuado de sua ciência, depois de haver negado a infalibilidade do Papa e proclamado a liberdade de exame para legitimar os próprios excessos, se tenha arvorado em cátedra inerrante de fé, constrangendo os seus sequazes a curvarem submissos a fronte ante os arestos inapeláveis de suas decisões infalíveis. Não houve tirania mais insuportável nem arrogância mais impetuosa que a deste pregador do livre exame. Todos os seus correligionários gemem sob o peso de seu jugo de ferro. MÜNZER dizia: "há dois papas: o de Roma e LUTERO, e este mais duro". Ao seu confidente BULINGER escrevia CALVINO: "já não é possível suportar os arrebatamentos de LUTERO: cega-o a tal extremo o amor próprio que não vê os próprios defeitos nem tolera que o contradigam"; e a MELANCHTHON: "com que impetuosidade fulmina o vosso Péricles! Singular exemplo dcixamos à posteridade quando preferimos abrir mão de nossa liberdade a irritar com a menor ofensa um homem só! Dizem que é de gênio arrebatado, de movimentos impetuosos; como se esta violência não se exaltasse com lhe compazerem os outros em tudo. Ousemos ao menos soltar um gemido livre".16 "Vivo na escravidão, como no antro de Cíclope", murmura por sua vez MELANCHTHON.17 Contra CARLOSTADT, seu antigo mestre, que em tirar as conclusões da nova doutrina foi além do que pretendia o reformador, obteve o decreto de expulsão da Saxônia e não o readmitiu senão com a promessa de "não defender em público, por palavra ou por escrito, suas opiniões contrários às de LUTERO".18 A MÜNZER, por motivo análogo, cassou a liberdade de palavra, apesar do "verbum Dei non est allegatum", que ele tantas vezes invocara contra a Igreja católica. Assim entendia LUTERO o livre exame!

Ao ver esta prepotência com que o chefe da Reforma impunha despoticamente as suas opiniões, crê toda a gente sensata que nada mais firme, nada mais assentado e maduramente refletido que o nova doutrina. Êrro. O inculcado emissário divino que modestamente se prefere a todos os doutores do céu e da terra, que blasona
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15. Ed. Wittemb. 1551, t. IV, p. 378.

16. CALVINI, opera, XII, 99.

17. Cfr. BOSSUET, Hist. des variations, 1. 5, n. 15, 16.

18. Weimar, XVIII, 86 sg.


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de inspirado do Espírito Santo, que recebeu "os seus dogmas do céu", hesita, retrata-se, contradiz-se, assenta e destroi dogmas pelos motivos mais fúteis, muda de opinião como um ator de roupa.

Trata-se do batismo incondicionado. A 12 de maio de 1531 escreve LUTERO a LINK: "Quanto ao batismo condicionado, depois de diligente ponderação definimos (1) que deve simplesmente eliminar-se da Igreja". Poucas horas bastaram para mudar-lhe o cânon definido após "diligente ponderação". No dia seguinte, novamente inspirado sem dúvida, escreve a OSSIANDRO: "Não posso condenar o batismo condicional dado às crianças de cujo batismo se duvida".19

E, 1519 escreve: "Confesso plenamente o supremo poder da Igreja Romana; fora de Jesus Cristo, Senhor Nosso, nada no céu e na terra se lhe deve preferir".21 Esta Igreja "É predileta de Deus; não pode haver razão alguma, por mais grave, que autorize a quem quer que seja a apartar-se dela e, com o cisma, separar-se da sua unidade".21 E, 1520 na sua Epístola luterana tece os mais rasgados encômios a LEÃO X, louva-lhe a vida intemerata, superior a qualquer ataque.22 Nesse mesmo ano já LEÃO X é o Anticristo, e a Igreja romana "uma licenciosa espelunca de ladrões, o mais impudente dos lupanares, o reino do pecado, da morte e do inferno".23


Em 1519, dois anos depois de haver iniciado publicamente a pregação da Reforma, defendendo-se dos adversários, ensina o culto dos santos, a existência do purgatório, a oração pelos defuntos, a prática do jejem, etc.24 Alguns anos depois rejeita tudo isto como idolatria, superstição e fanatismo.


Em 1541, jura por Cristo que, ao iniciar a sua pregação contra o dominicano TETZEL não sabia nem o que significava a palavra indulgência"25 E pensar que as indulgência foram o primeiro cavalo de batalha contra Roma, o especioso pretexto com que o monge augustiniano saiu a público para divulgar os seus erros e pregar a revolta!26
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19. DE WETTE, IV, 254, 256

20. DE WETTE, I, 234.

21. Weimar, II, 72

22. DE WETTE, I, 498.

23. DE WETTE, I, 522, 500; Weimar, VII, 44.

24.Weimar, II, 69 ss.

25. Erl., XXVI, 50 ss. Aqui, porém, como tantas outras vezes, LUTERO, falta à verdade. Mas o caráter do homem revela-se do mesmo modo.

26. Pretexto, dizemos, porque antes de 1517, no seu comentário da epístola ao Romanos já LUTERO havia desgarrado da tradição católica, ensinando erros palmares acerca da concupiscência, do pecado original, da justificação, do livre arbítrio e da graça. Desde 1515 estava ele maduro para a apostasia. A pregação de TETZEL, foi apenas uma deste imponderáveis que muitas vezes bastam para desencadear um cataclismo irreparável.


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Quanto à origem e legitimidade de sua missão, em pouco mais de 15 anos, LUTERO mudou pelo menos 14 vezes de parecer.27
O oportunismo decidia da escolha. Uma opinião servia-lhe para combater os católicos, outra para defender-se dos colegas, uma terceira para pacificar os ânimos turbulentos nas comunidades recém-formadas. O guarda-roupa do ator era bem provido: havia trajes para todas as personagens e todos os papéis.

Não fora difícil continuar esse elenco. Quase não há dogma importante sobre o qual LUTERO não tivesse, em épocas diversas, sustentado o sim e o não.

Não são menos instrutivas para o conhecimento da psicologia do reformador as razões que o induziam a abraçar suas opiniões. Acerca do comunhão sob uma ou duas espécies escreve ele na sua fórmula da Missa: "Se um Concílio ordenasse ou permitisse as duas espécies, por despeito ao Concílio, nós só receberíamos uma, ou mesmo, nem uma nem outra e anatematizaríamos os que, em virtude desta ordenação, recebesse as duas".28
De outra feita, declara haver finalmente suprimido a elevação da hóstia por despeito ao Papado e de havê-la conservado por tanto tempo por despeito a CARLOSTADT.29 Com igual baixeza escrevia em 1523: "Se acontecesse que um, dois, mil ou mais concílios decidissem que os eclesiásticos pudessem contrar matrimônio, preferiria, confiando na graça de Deus, perdoar a quem, por toda a vida, tivesse uma, duas ou três meretrizes, do que aquele que, consoante à decisão conciliar, tomasse mulher legítima e sem tal decisão não a pudesse tomar".30 É ainda a mesma disposição dum ânimo acirrado contra os odiados papistas que lhe ditava estas linhas: "enquanto eles (os papistas), a seu juízo, triunfam de uma heresia minha, quero propor outra".31 Que mescla de trivialidade, licença e mentira num reformador evangélico!

Lembremos ainda um fato: a célebre disputa sacramentária que dividiu os inovadores em dois campos irreconciliáveis, e teve começo nesta cena de taverna. Após um sermão do mestre, CARLOSTADT
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27. Cfr. DOELLINGER, Die Reformation, III, 205 ss.

28. Cfr. BOSSUET, Hist. des Variation, 1. 2, n. 10.

29. Erl., XXXII, 420, 422.

30. Weimar, XII, 237.

31. Weimar, VI, 501.


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entra com ele na Taverna do Urso Negro (Jura) e declara-lhe não poder tolerar a sua opinião sobre a presença real. LUTERO, com ar desdenhoso, desafia-o a impuganá-la por escrito e promete-lhe, se o fizer, um florim. Saca, então, da algibeira a moeda. CARLOSTADT aceita-a. Espuma o vinho; os dois combatentes apertam-se as mãos e bebem à saúde um do outro. Estava declarada a guerra aos 22 de agosto de 1523. Ao despedir-se, CARLOSTADT: "Possa ver-te esmagado por um rolo!" Recambiando-lhe a amabilidade, LUTERO: "Mil raios te partam antes de saíres da cidade!".

- "Eis o novo evangelho, eis os atos dos novos apóstolos", conclui BOSSUET referindo o edificante episódio.32Mais sobrenatural é o motivo que o induziu a suprimir a missa. Foi vitória da terrível dialética do demônio. LUTERO narra por miúdo esta cena e conclui: "Nem, é de maravilhar porque a lógica do diabo era acompanhada de voz tão espantosa que se me gelava o sangue nas veias. Compreendi então por que amanhecem alguns mortos; é porque o demônio pode matar e sufocar os homens, e, sem chegar a tais extremos, enredá-los no seu disputar em tais embaraços que podem ocasionar a morte; eu mesmo experimentei muitas vezes".33 Mente LUTERO nesta revelação? É um impostor. Fala a verdade? E que crédito merece então um homem que teve por mestre em cristianismo o pai da mentira? Aos admiradores do reformador o escolher uma das aspas do inevitável dilema. Na citação acima já terá notado o leitor que papel importante desempenhou o diabo na vida íntima do heresiarca. Com efeito, Satanás não o deixa um instante tranquilo: acompanha-o de dia e de noite, na Igreja e na adega. Mais de uma vez declarou LUTERO que a sua vida fora "uma série de duelos" com Satã. Com o diabo dormia ele mais vezes de que com a sua Catarina. Em toda parte o via: na nuvem que passa, no raio que fuzila, no trovão que ribomba, nas florestas, nas águas, nos desertos, empestando os ares e os campos. Diabos se escondem nas serpentes e lagartos, nos macacos e nos papagaios; diabo na mosca que vê pousar nas páginas do seu livro, diabos, até, nas nozes que lhe envia uma admiradora. O espírito do mal é o deus ex-máquina que desata todos os nós difíceis. À sua ação maligna atribui o
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32. BOSSUET, Hist. des Variat., 1. II, n. 11. Cfr. GRISAR, Luther, II, 321; Weimar, XV, 340.

33. De abrogation missae prevatae (Von der Winkelmesse), Weimar, XXXVIII, 198.


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reformador todas as desordens morais, todas as calamidades sociais desencadeadas por suas doutrinas subersivas.34

Esta obsessão diabólica que torturava a alma do infeliz renegado espelha-se em todos os seus escritos. De diabos está cheio seu estilo; algumas das suas páginas dir-se-iam escritas no inferno. O opúsculo contra o duque Henrique de Brunswick, o demônio tem a honra de ser nomeado 146 vezes; no livro dos concílio em 4 linhas se fala 15 vezes de diabos.35 Os adversários da Reforma, têm "o coração satanizado, persantanizado e supersatanizado". A LUTERO cabe a inglória iniciativa de haver posto em voga este novo gênero de literatura, a literatura diabólica, em cujo diapasão afinaram o tom os outros reformadores.


Sinceramente, esta linguagem, estas incertezas e contradições doutrinais, esta frivolidade em construir e destruir dogmas, esta soberba luciferina dizem bem num enviado do céu para restaurar cristianismo?

Até aqui não encenamos senão aos vícios que mancham a parte superior do homem. Mas por uma lei infatigável da divina Providência. a soberba do espírito é castigada com as rebeldias da carne. Desce abaixo do bruto quem se arvora em divindade.




LUTERO oferece à história mais um triste exemplo desta punição providencial. Em 1521, uns restos de educação católica ditavam-lhe estas palavras de uma carta a ESPALATINO: "Santo Deus! Os nossos wittembergenses quererão casar também os frades? A mim é que não hão de impingir mulher... Toma tento e não cases para não incorreres nas tribulações da carne".36 Com os anos, as novas doutrinas abriram brecha no seu propósito. Em 1525, estalou às súbitas no mundo reformado a inesperada notícia37 que LUTERO, aos 41 anos, havia casado com Catarina de Bora, egressa
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34. Sobre a demonologia e demonomania de Lutero, cfr. GRISAR, Luter, III, 231-257.



35. Em 1541 quando os turcos ameaçavam invadir a Alemanha, publicou LUTERO a seguinte oração: "Sabeis, Senhor, que o diabo, o papa e o turco não têm razão nem direito de nos vexar, porque nunca os ofendemos. Mas porque confessamos que vós, Padre, vosso Filho, Jesus Cristo, e o Espírito Santo sois um só Deus eterno, nos odeiam e perseguem. Se renunciarmos esta fé, nada teríamos que recear deles". Erl., XXXII, 89. - Quanta cegueira! Quanta calúnia! O diabo, o papa e o turco no mesmo plano! O papa que persegue a LUTERO pelo sua fé na SS. Trindade! LUTERO que se gloria de nunca haver descontentado o demônio!!



36. DE WETTE, II, 40, 41.



37. No dia seguinte ao do casamento de LUTERO escrevia JUSTO JONAS a ESPALATINO: "Rei insigniter novae nuncia tibivenit haec mea epistola: Lutherus noster duxit uxorem Catharina de Bora. Heri adfui rei".


MISSÃO RELIGIOSA DE LUTERO - Pg. 185


cisterciense. Que acontecera? O reformador resolvera-se repentinamente ao casamento para fechar a boca às más línguas.38 As más línguas, porém, não taramelavam sem motivo. Numa carta de 1525 endereçada a RÜHEL, conselheiro de Mansfeld, dizia o heresiarca: "se posso, a despeito do demônio (sic!) inda hei de casar com a minha Catarina,, antes de morrer".39 Como quer que seja a impressão causada nos contemporâneos e correligionários foi das mais desfavoráveis. LUTERO percebeu-o. "Com este meu casamento tornei-me tão desprezível que os anjos se hão de rir e os demônios chorar. Só em mim escarnece o mundo a obra de Deus como ímpia e diabólica.40 Numa confidência a CAMERÁRIO dizia MELANCHTHON: "Lutero era um homem extremamente leviano [é a interpretação mais benigna do grego usado pelo humanista reformador: Estin o aner ws malista euXeres] e as freiras [por ele soltadas dos conventos] que lhe armavam laços com grande astúcia acabaram por envisgá-lo. O frequente comércio com elas teria talvez efeminado um homem mais forte e de mais forte e de mais nobres sentimentos e ateado o incêndio".41 Qual tenha sido o resto da vida do ex-frade circundado desse elemento feminino capaz, no dizer de MELANCHTHON, de enervar constituiçlões morais de mais robusta envergadura, é fácil imaginar e inconveniente dizer.42

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38. "Maligna fama id effecit ut DOCTOR Martinus insperato fieret conjux", escrevia BLOCHENGER a ESPALATINO. Ap. MENKEENII, scriptores rerum Germanicarum, t. II, 645.



39. DE WETTE, II, 655.



40. DE WETTE, III, 2,3. A vida escandalosa de LUTERO já tinha começado havia mais tempo, como se pode ver desta carta datada de 1522 ao amigo ESPALATINO. Não me atrevendo a tirá-la em linguagem, aí vai ela sob os véus pouco transparentes, entre nós, do latim: "Ceterum, quod de meo conjugio scribis nolo hoc mireres me non ducere qui sic famosus sum amator. Hoc magis mirum quod qui toties de conjugio scribo et misceor feminis, quam si exemplum meum petis, habes ecce potentissimum. Nam tres simul uxores habui et tam fortiter amavi ut duas amiserim quae alios sponsos accepturae sunt... tu vero segnis ille amator, ne unius quidem audes maritus fieri". DE WETTE, II, 646. - A BERNARDO KOPPE, que raptara Catarina de Bora, escreve LUTERO: "Saiba que estou ligado à cauda de minha Kette". DE WETTE, III, 9.



41. MELANCHTHON, Brief en Camerarius uber Luthers Heirat vom 16 Junii 1525, von P. A. KERCH, Mainz, 1900, p. 8, 11. Esta carta preciosa para a história foi escrita originariamentes em grego. CAMERÁRIO na sua edição das cartas de MELANCHTHON (1565) falsificou-a (como outras epístolas) e o texto falsificado foi acolhido no Corpus reformatorum. I, 774 (com data de 24 de julho); O autógrafo que se conserva atualmente na biblioteca do príncipe Chigi (transferida, há pouco para a Vaticana), foi achado no último quartel do século passado e publicado por W. MEYER, no relatório da sessão da Academia de Munique em 1876.



42. Como explicar tamanha decadência moral num religioso? O fato não encerra nenhum enigma para quem conhece os princípios da ascética cristã. O hábito não faz o monge. O religioso infiel aos deveres de sua profissão e às inspirações da graça pode resvalar nos mais profundos abismos da degradação. Corruptio optimi pessima. Quantos nos é lícito conjecturar, pelas próprias confidências de LUTERO, sobre o drama interior que se desenrolou na sua alma, foi esta infedelidade que arrastou o apóstata à ruína fatal. E, 1516 (26 de outubro), escrevendo a LANGE em Erfurt, depois de enumerar as mil ocupações que lhe dissipavam o espírito, dizia o frade: "Raras vezes me sobra tempo necessário para rezar o breviário e celebrar; acrescentem-se minhas próprias tentações da carne, do mundo e do diabo! DE WETTE, I, 41. Já nesta época ele podia dizer com verdade o que confessava em 1510: "sei que não vivo em conformidade com o que ensino". DE WETTE, I, 402. "Confesso-te, escrevia ainda no mesmo ano de 1516, que minha vida mais e mais se aproxima do inferno; de dia para dia me vou tornando pior e mais miserável".ENDERS, I, 16. Mais tarde em 1519 (20 fev) escreveia a seu superior STAUPITZ: "Sou um homem exposto e implicado na sociedade, na crápula, nos movimentos carnais, na negligência e em outras moléstias, a que se vêm ajuntar as do meu próprio ofício". DE WETTE, I, 232. Excomungado em Worms (1521), retirou-se para Warburgo onde o eleitor Frederico lhe ofereceu um asilo. Longe de entrar em si e arrepender-se, o infeliz frade entregou-se à ociosidade e à moleza. A 13 de julho escrevia textualmente a MELANCHTHON: "Ego hic insensatus et induratus sedeo in otio, proh dolor! Parum orans, nihil gemens pro Ecclesia Dei, quia carnis meae indomitae uror magnis ignibua. Summa: qui fervere spiritu debeo, ferveo carne, libidine, pigritia, otio, somnolentia". DE WETTE, II, 22. "Orate pro me, quaeso vos, peccatis enim immergo in hac solitudine". Idid. p. 26. Não assim se preparam moralmente os a que Deus confia a missão de reformar a sua Igreja. De negligência e negligência, de queda em queda, de pecado em pecado, rolou o infeliz religioso até a grande apostasia. Terrível exemplo" Lição terrível! Cfr. GRISAR, Luther , I (2), 222-227.


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Raras vezes a vida licenciosa vai desacompanhada dos excessos intemperantes da mesa. Em LUTERO, a febre de concupiscência carnal era estimulada pela embriaguez e pela crápula. No trincar, dizia ele, não quero que outros entrem em competência comigo "quia non omnes ferunt meos labores".45 À sua Catarina escrevia em 1540: "Vou comendo como um boêmio e bebendo como um alemão, louvado seja Deus!".44 Em 25 de julho de 1534 de novo à Catarina: "Ontem aqui bebi mal e depois fui obrigado a cantar; bebi mal e sinto-o muito. Como quisera haver bebido bem ao pensar que bom vinho e que boa cerveja tenho em casa, e mais uma bela mulher... Bem farias em mandar-me daí toda a adega bem provida do meu vinho e, o mais frequentemente que puderes, um barril de tua cerveja".45


De Watburgo (14 de maio de 1541) mandava dizer: "Aqui passo todo o dia no ócio e na embriagues".46 Na noite em que o reformador, em compnhia de outros, chegou a Erfurt (19 de outubro de 1522) não se fez senão "beber e gritar, como de costume",47 escreve MELANCHTHON presente à cena. Os excessos do copo chegaram a fazer-lhe mal à saúde. Em 15 de janeiro de 1531 escrevia LINK: "a dor de cabeça, contraída em Coburgo por causa

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43. Tischreden, Ed. Kroker, 1903, n. 318.

44. BURKARDT, Dr. M. Luth. Briefwechsel, Leipzig, 1806, -. 357. Cit., por H. BRÜCE, Lehrbuch der Kerchengeschichte (4), Mainz 1888, p. 614.


45. DE WETTE, IV, 553.


46. "Ego otiosus hic et crapulosus sedeo tota die". DE WETTE, II, 6.


47. Corpus reformatorum, I, 579.



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do vinho velho, ainda não foi debelada pela cerveja de Witemberga".48



O nobre motivo por que o reformador ia pedir ao aturdimento do vinho e da cerveja a distração e a paz que não encontrava na consciência, declara-o ele próprio numa carta consolatória a um amigo (6 de nov. de 1530). JERÔNIMO WELLER trabalhado de frequentes acessos de melancolia, LUTERO, como bom diretor espiritual, manda-lhe esta receita anti-hipocondríaca: "Quando te vexar o diabo com estes pensamentos, palestra com os amigos, bebe mais largamente, joga, brinca ou ocupa-te em alguma coisa. De quando em quando se deve beber com mais abundância, jogar, divertir-se e mesmo fazer algum pecado em ódio e acinte ao diabo para lhe não darmos azo de perturbar a consciência com ninharias... Quando te disser o diabo: não bebas, responde-lhe: por isso mesmo que me proíbes hei de beber e em nome de J. C. beberei mais copiosamente... Por que pensas que eu bebo, assim, com mais largueza, cavaqueio com mais liberdade e banqueteio-me com mais frequência, senão para vexar e ridicularizar o demônio que me quer vexar e ridicularizar a mim?... Todo o decálogo se nos deve apagar dos olhos e da alma, a nós tão perseguidos e molestados pelo diabo".49 E se bem o aconselhou, melhor o fazia. Era em comezainas pantagruélicas, entre o espumar dos vinhos generosos e os vapores das iguarias fumegantes que se reuniam os concílios dos novos reformadores e se decidiam as questões mais transcendentes do dogma e da moral evangélica.

Na manhã seguinte à da morte de LUTERO encontraram-no por terra com o abdome intumescido pelo demasiado comer e beber. O reformador tivera no dia precedente um mesa ricamente preparada em abundância de vinhos doces e estrangeiros".50

Assim acabou como um gastrônomo e libertino vulgar o apóstata que se arvorara em reformador do cristianismo.51 "Na jerarquia
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48. de wette, iv, 213.

49. DE WETTE, IV, 188.

50. Paulus, Luthers lebensende und der Eislebener Apotheker Johann Landau, Mainz, 1896, p. 5.

51. Tal é o LUTERO histórico. Porque, como já observou um teólogo protestante, "il faut distinguer deux Luther: l'un mythique, l'autre historique. Ordinairement, Vou ne s'occupe que du mythe, orné de toutes des perfections. Dès que quelqu'un veut l'apprécier, on chausse le cothurne; on de prend de aut; on feit litière de la réalité.Et le plus triste, c'est que, si l'on veut ménager ce culte envers Luther, il faut recourir a d'étrnages procédés pour juger le personnage. Cuter ses oriores oarikes est une ubsykte et repporté ses estes une infamie. Et se dáventure l'on veut. d'une main, crayonner en portrait du vrai Luther, iul faut, de l'aute, couronner la tête du mythe d'un nimbe de inteté. Faute de cette souplesse, on ferá crier au scandale". KROGH-TONNING, L Protestantism contemporain, Ruine doctgrinale, p. 19.


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dos anjos rebeldes, em que pese aos seus amigos, LUTERO ocupa o degrau mais baixo, mais próximo do lodo e do pântano".52

E as Sombras morais do homem projetam-se sobre toda a sua obra. Ante o espetáculo desta vida desregrada, temos o direito de pedir aos nossos adversários que nos demonstrem com razões peremptórias que este monge devasso, beberraão, grosseiro e insultador foi feito eleito de Deus para reconduzir à sua pureza primitiva a Igreja de S. TOMÁS e de S. BERNARDO, de S. GREGBÓRIO e de S. LEÃO, de S. AGOSTINHO e de S. IRINEU.

O perfil moral dos outros reformadores não é mais edificante que o do seu patriarca.

CALVINO adoece do mesmo orgulho que o mestre. Aos 26 anos, sem nenhuma formação teológica séria, publica a sua Christianae religiosis institutio, em que abraça toda a doutrina cristã necessária à salvação e traça a carta de marear pela qual orientará, nas mais sublimes e intrincadas questões do dogma e da moral, toda a sua atividade de reformador improvisado. Para este jovem de 5 lustros toda a Igreja romana, todos os SS. Padres erraram grosseiramente na inteligência do Evangelho! Ele só, em três anos de estudo privado e feito de afogadilho, elevou-se ao conceito genuíno das grandes verdades ignoradas pelo mundo inteiro. É o farol luminoso a brilhar solitário na treva universal. Falando da satisfação devida pelos pecados cometidos, escreve: "Pouco me abala o que a respeito da satisfação anda por aí a cada passo nos escritos dos antigos. Vejo com efeito que muitos deles, antes, falando francamente, quase todos cujas obras chegaram até nós desgarraram nesta ponto da verdade"53 Ai de quem se atreve a discordar do jovem doutor! Estultos, loucos, frenéticos, sofistas, ébrios, furiosos, sacrílegos, rábulas, sicofantas, bestas-feras, ateus, asnos, porcos, são os delicados epítetos com que ele mimoseia o seus mais venerandos adversários.54 Todo o seu estilo está marchetado com
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52. TH. MAINAGE, Témoignage des Apostats(2), Paris, Beauchense, 1916, p. 76.

53. CALV., Inst. Rel. Christ., t. III, c., IV, N. 38; Opera, II, 489.

54. "Quel homme fut jamais plus tranchant, plus impérieux, plus décisif, plus divinement infalible a son grê que Calvin, pour qui la moindre opposition, la moindre objection qu'on osait lui faire était toujuours une oeuvre digne de Satan, un crime digne du feu?". ROUSSEAU, Lettres de la Montagne, Amsterdam, 1764, 2e lettre, t. I, p. 203. Vá o leitor observando como todos estes inimigos da infalibilidade constituída por J. C. se vão guindando às alturas de oráculos divinos em nome do livre exame. Que ironia! Que terrível castigo infligido à soberba pela justiça imanente das coisas que é a expressão da Providência do governo da humanidade!


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estas gemas preciosas. Enfermava em Ratisbona em 1541 o célebre teólogo JOÃO ECKIUS. CALVINO escreve: "Dizem que Eckius convalescerá; o mundo ainda não merece ser libertado desta besta".55 Diz bem esta gíria das badernas num restaurador do "cristianismo evangélico"?

Mas não pararam em palavras os excessos de sua intolerancia. Ele, que em impugnar a Igreja católica reclamou todas as liberdades e todas as licenças, mal firmou com o seu poder em Genebra, instituiu uma inquisição em cujo confronto emplidecem os maiores rigores do S. Ofício espanhol. Penas severíssimas a quem voltasse ao catolicismo, a quem não assistisse aos sermões dos novos predicantes, a quem ousasse proferir palavra contra as suas doutrinas ou a sua intangível pessoa. "Il faisait soigneusemente enrigistrer depuis des années les moindres propos tenus contre lui et contre sa doctrine de la prédistination, avec laquelle il s'était tellement identifié, qu'il etait aussi dangereux de parle contre ce dogme que contre lui; les pauves étaint trainés dans les cachots, fouettés, honis, promenés par la ville en chemise et nu-pieds, une torche à la main pour expier ce qu'il lui plaisait l'appeler des blasphèmes".56 SEBASTIÃO CASTILLO, reitor do ginásio e outrora amigo do reformador, porque ele discordou em alguns pontos de doutrina, foi acusado, destituído do cargo e expulso de Genebra. PEDRO AMEAUX, senador, por haver proferido num banquete, entre as alegrias do vinho, algumas palavras contra CALVINO foi encarcerado e condenado à mais humilhante das reparações.57 BOLSEC, pelo grande delito de haver julgado falsa a doutrina calvinista da predestinação, depois de várias semanas de enxovia, foi condenado ao desterro.

Outros, mais infelizes, pagaram com a vida a imperdoável ousadia de contrariar o tiranete de Genebra. JAIME CRUET, por haver dado de cão ao reformador, depois de submetido à tortura, foi decapitado em 1547. MIGUEL SERVET, médico espanhol, por haver negado a Trindade e censurado algumas opiniões do mestre,
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55. Opera, XI, 217.

56. J. B. GALEFFE, Notices génealogiques sur les familes genévoises, Genéve, 1836, III, 545. O autor é protestante.

57. Eis os termos da sentença: "Qu'il soit condamné à devoir faire le tour de la ville en chemise, tête-nue, une torche à la main, et depuis, devant le tribunal, venir crier merci à Dieu et à la justice, les genoux en terre, confessant avoir mal et méchamment profété les dites paroles vileines, en étant déplaisant d'icelles avoir dites, le condamant aussi à tous les dépens et que la sentençe soit proferée publiquement". GALIFFE, Nouvelles pages d'histoire axacte, 1865, p. 60.


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apesar de protestar que não havia cometido nenhum crime em Genebra e de pedir debalde se lhe concedesse um advogado, foi preso e mandado à fogueira. Em opúsculo especial, tentou CALVINO justificar o seu proceder em face da Europa. Os colegas MELANCHTHON, BULLINGER e MUSCULUS aplaudiram a energia de sua atitude.58 À pena semelhante à de SERVET só se furtou o italiano J. VALENTINO GENTILI, mediante humildes deprecações; mais tarde, porém, foi decapitado em Berna.

Causa horror percorrer os processos criminais de Genebra, durante o governo deste "Prête Tyran qui soumit Genève à la plus infame servitude".59 "Quant an nombre de ces autos-da-fé on peut assurer qu'il n'étaint pas, à beacoup près par année, ce qu'il fut par mois ou pourrait dire par semaine, sous le règne de Calvin, ou l'on eut souvent plusieurs spetacles de ce entre dans la même journée".60 Deux années de règne de Calvin virent éclore 414 procès criminels... Il y a des centaines de procès de ce genre pour chaque année de cette époque que l'on a osé appeller les plus belles pages de notre histoire".61 O mesmo autor em outra obra, falando-nos das execuções capitais, diz: "Ces exécuctions, dont 30 concernent des hommes et 28 des personnes du sexe se répartissent ainsi selon la nature du supllice: 13 personnes pendues, 10 décapitées, dont 55 écartelées par dessus le marché, et 35 brulées vives apès l'imputation du poigent droit, quelques-uns après avoir été en outre tenaillées avec des pinces rouges au feu".62 Nous pensons qu'ensoit assez pour édifier le lecteus sur da coucaur, l'intégrité et les prétendues hautes lumières de la justice calviniste, a une époque ou elle avait encore, dans son propre intérêt, des ménagements a garder. On peut, d'après cela, se faire une idée de ce qu'elle fut lorsque son chefg se vit maitre absolu de la situiation, lorsque le vourreau eut ordre de portes toujours son glaive sous le bras, a l'époque
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58. Citemos apenas MELANCHTHON, o "meigo" MILANCHTHON que escrevia a CALVINO: "A Igreja, hoje e sempre, te deve e deverá eterna gratidão", Corp. Ref. VIII, 562; a BULLINGER em 1555: "foi justa a sentença contra Servet... e admiro-me como haja ainda quem reprove a sua severidade". Corp. Ref., VIII, 523; dois anos mais tarde, em 1567; "condenando a Servet os magistrados de Genebra deixam aos pósteros memorável exemplo de piedade". Corp. ref., IX, 133.

59. GALIFFE, Notices généalogiques, III, 538.

60. GALIFFE, Nouvelles pages d'histoire exacte p. 105, ss

61. GALIFFE, Notices généalogiques, III, 544.

62. GALIFFE, Nouvelle pages, p. 100. "De 1542 a 1546, que foi o período mais brando de seu governo contam-se 58 execuções capitais, 76 desterros e 900 prisões" JEANTET, Histoire de la persécution religiuse à Genève, Paris, Lecoffre, 1879, p. 473.


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enfin, ou la moyenne des procès n1était plus sulement de 40 a 50, mais de 200 a 300 par année".65

Na cegueira de seu orgulho, o chefe do protestantismo suiço caiu nas mais extravagantes ridicularias. Eis algumas amostras das suas proibições moralizadoras: "Sont défenduses aux noces au banquet, toutes confitures, excepté la dragée, a peine de 60 sols". 64 "Tout espèce d'amusement fut proscrite comme invention du diable, sous des peines très sévères, et surtout le jeu, les chansons et la danse".65 " On chechait tellement a anéantir toute espèce de liberté, qu'on défendit d'aller boire de l'eau d'une fontaine à la montaigne, qui avait la réputation de guérir la fièvre, prétendant que c'était un fait d'idolatrie. Il y a des masses de dénonciations et d'interrogations de gens punis pour s'être guéris de cette manière (1556).65 CALVINO, como aliás todos os reformadores, foi um grande supersticioso. E é este homem que o Sr. CARLOS PEREIRA, numa comparação, cuja irreverência raia pela blasfêmia, não hesita em assemelhar ao "Paulo do cristianismo restaurado de que Lutero era o Pedro", p. 53.67 
De HENRIQUE VIII, o homem das 7 mulheres, voltaremos a falar mais tarde. Por agora basta esta confissão de um protestante inglês: "Pelo respeito devido aos conselhos do meu país não quisera falar do insignificante motivo que produziu este grande acontecimento (a apostasia), mas é tão conhecido que passá-lo em silêncio pudera parecer afetação: foi a paixão ilícita de HENRIQUE por

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63. GALIFFE, Nouvelle pages, p. 105.

64. Calvin à Genève, art. 141.

65.GELIFFE, Nat. Généal., III, 381. Apesar destas medidas severas da polícia reformadora, a imoralidade alastrou em Genebra como em todos os lugares onde prevaleceu a Reforma. "Vers la fin de la carri du rèformateur... l'immoralité... a, tout à coup.atteint son apogée. Le système de répression avait donc bien mal réussi. GALIFFE, Quelquers pages d'histoireaxacte, p. 95. "Jamais l'immoralité secrète ne fut plus grande à Genève que précisement à l'époque qui devait plus que toute autre servir de pierre de touche à ce même système, appliqué exclusivement à ceux qui étalent censés s'y être volontairemente soumis". Ibid., p. 96, Cfr pp.96-98.

66. GALIFFE, Not. généal., III, 528. Sobre os excessos e tirania de CALVINO em Genebra, cfr. J. B. GALIFFE, Quelques pages d'histoire, soit les procès criminels intentés A.Perin et Laurent Maigré. Mém. de l'Institut National Genévois, 1862; In. Nouvelles pages d'histoire exacte, soit le procés de P. Almeaux., Mem. 1863; F. W. KAMPSCHULTE, Joh. Calvin, seine Kirche und sein Staat in Genf. I, Leipzig, 1869; Calvin à Genève, Quelques pages de sa vie à l'occasion du 300me anniversaire de sa mort, par un genévois, Genève, 1864.

67. Dos colaboradores de CALVINO contentar-me-ei com a observação de GALIFFE: "Pluseurs des collegues du réfomateus eurent des histoires três scandaleuses dont les détails sieurs des collegues du réformateus eurent des histoires três scandaleuses dont les détails ne peuvent entrer dana un ouvrage destiné aux deux sexes; je pourrai en publier qulques unes en latin por l'édification des tartufes". Notices Généalogiques, 1. III, P. 381, nota.


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ANA DE BOLEYN. Se a paixão e o capricho não houveram influído nas disposições deste monarca ele teria conservado as suas relações amistosas com a S. Sé; o título de Defensor da fé que adquirira com os seus escritos lhe seria devido até à morte, e seus sucessores poderiam usá-lo, sem que fosse, como é hoje, uma irrisão para o doador e para o dom. Mas a passagem da Igreja a uma seita é quase sempre pelo caminho dos vícios e a volta duma seita à Igreja é sempre pelo caminho das virtude...Se o motivo foi desprezível, os meios foram ainda mais horríveis, etc."68

ZWINGLIO, pároco suíço, foi expulso da paróquia pelos seus costumes dissolutos. Antes de demolir o dogma já havia feito tábua rasa do Decálogo. Fez-se então reformador, casou-se apesar de sacerdote, mas infelizmente a sua mulher não era a única que lhe frequentava a casa. Os escândalos eram públicos e mais de uma vez ele os confessou abertamente. Aos irmãos que, solícitos de sua boa fama, lhe pediam explicações sobre as más vozes que corriam a seu respeito, respondia em 1522: "Se vos disserem que peco por orgulho, intemperança e libidinagem, crede sem dificuldade; infelizmente sou sujeito a estes e ainda outros vícios".69 Numa súplica ao bispo de Constança, para que suprimisse o celibato eclesiástico: "Arsimus pro pudor! Tantopere et multa indecore gessimus".70

Depois, a fim de evitar os escândalos que neste ponto dava aos fiéis, pedia ao bispo a abolição do celibato: "Per igitur communem Christum, per libertatem ejus sanguine partam, per paternum affectum, quem nobis debes, per miseriam animularum nostrarum, per vulnera conscientiarum, per quidquid est divinum, quidquid est humanum, te oramos ut supplices clementer respicias, ac quod temere aedificatum est cum concilio demoliri sinas".71 A súplica é assinada por 10 sacerdotes, o último dos quais Zwinglio.

TEODORO BEZA, discípulo de CALVINO, assinalou-se também pelo seu espírito de libertinagem e poesias licenciosas. Viveu com Mme. Cláudia, já esposada a um alfaiate de Paris que ainda vivia. Esta infeliz houve de padecer muitos desprazeres por causa das
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68. WILLIAM FITZ, Lettre d'Atticus, Paris, 1862, p. 112. Ap. AUG. NICOLAS, Études philosophiques sur le chrsitianisme(26), Paris, 1895, p. 268.

69. Werke, I, 325.

70. Werke, I, 204.

71. Werke, I, 206.


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numerosas concorrentes que lhe frequentavam a casa. Exortado um dia a converter-se ao catolicismo, o velho sectário abaixou, envergonhado, a fronte e apontou o quarto onde de achava a concubina.

CARLOSTADT, ECOLAMPÁDIO e BUCERO eram sacerdotes que, infiéis aos seus juramentos, saudaram com palmas o advento da Reforma que lhes abria a porta do matrimônio. A primeira preocupação dos novos evangelistas foi escolher uma companheira que lhes mitigasse os dissabores do apostolado.

O exemplo de cima é contagioso. Onde os mestres são o que acabamos de ver, que serão os discípulos? Diz-no-lo a história. Estes padres e frades apóstatas, que, impacientes da disciplina monástica, se bandearam para o partido reformado, não puderam conservar-se nesta mediania moral de qualquer homem honesto. Quem negara a fé jurada a Deus, como havia de ser fiel à palavra dada a uma mulher? A poligamia começou a alastrar entre os novos evangélicos. O "pároco" MIGUEL KRAMER tinha três mulheres. SEBASTIÃO FLASH, pregador luterano, fala-nos da "permuta entre as mulheres (commutationem oxorem)" frequente entre os reformados. De um predicante superior afirma: "queria concluir comigo um contrato sobre a troca de mu

mulheres e, ao ver que por motivo algum me induzia a cometer semelhante delito, tentou constranger-me à viva força. O sentimento do pudor veda-me o demorar-me mais largamente sobre fatos análogos".72 

Mas ninguém estigmatizou com mais violência ou pintou com mais cruel realismo os costumes e o caráter moral dos primeiros reformadores do que os seus próprios chefes. Nas rusgas internas, que sempre estiveram na ordem do dia entre os protestantes, punham ao soaleiro todas as misérias domésticas. Mestres e discípulos mimoseavam-se com as mais descabeladas verrinas. Ouçamos primeiro o juízo dos mestres.

Para LUTERO, CARLOSTLADT é "um diabo doméstico e traidor";73 JOÃO AGRÍCOLA "um grande soberbo e temerário que quer aparecer só e, no seu orgulho e arrogância, passa acima dos outros";74 os sacramentários (ZWINGLIO, CARLOSTADT, ECOLAMPÁRIO, SCHWENKFELD)
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72. Professie catholica m. Seb. Flaschii, p. 219, ss.

73. Weimar, XVIII, 215. Quando em 1541 noticiaram a LUTERO a morte de CARLOSTADT com a circunstância de que o demônio tinha aparecido ao moribundo para levar-lhe a alma ao inferno: "Que maravilha! Disse o reformador, recebeu o prêmio que havia merecido". DE WETTE, V, 463.

74. Erl. LXI, 11.


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são "assassinos das almas, homens satanizados, persatanizados, supersatanizados, de coração malvado e língua mentirosa".75

Para CALVINO, LUTERO "é um grande vicioso. Oxalá trabalhasse por melhor coibir a violência que lhe ferve sempre nas veias, oxalá se aplicasse a conhecer melhor os seus vícios; MELANCHTHON é inconstante e cobarde, OSSIANDER um sedutor, uma besta-fera incapaz de ser domesticada; AUGILAND, ministro em Montbéliard, um orgulhoso, rixador e arrebatado; MEMMON, um infeliz maniqueu; BUCERO, alma servil que já não sabe encontrar palavras para amansar a ferocidade de LUTERO e dos seus".76


Os discípulos, se bem recebiam, melhor davam. De ambos os lados a aljava era bem provida; os virotões ervados cruzavam-se e feriam fundo em ambos os campos. LUTERO, no sentir de ECOLAMPÁDIO, é "calumniandi magister et sophistarum princeps".77 Creio que desde os tempos dos Apóstolos, escrevia LEO JUDAE em 1534, não houve quem falasse tão bscura, tão ridícula, tão impiamente como LUTERO".78 "Deus me condene, dizia por sua vez ZWINGLIO, se LUTERO não excede em estultícia a FABER, em impureza a ECK, em ousadia a COCHLAEUS, numa palavra, a todos em todos os vícios".79 CALVINO, no sentir de MELANCHTHON, era um caráter obstinado; de uma arrogância intolerável acrescentava BEADOIN; segundo BUCERO, o vírus da maledicência passara-lhe nas veias como o da raiva nos cães danados; para PAPIRO MASSON, sob uma aparência de modéstia e simplicidade, o reformador genebrino alimentava um orgulho, uma sede de sangue insaciável. O luterno FABER todas as noites antes de deitar recitava esta oração: "Senhor Jesus, esmagai depressa sob os nossos pés a cabeça de Satã e livrai a vossa igreja da peste calviniana".80 Poderíamos encher ainda várias páginas de citações análogas em que os pais do protestantismo, ou assoalhassem a verdade, ou mutuamente se caluniasse, sempre se desprestigiavam moralmente.


Mas paremos aqui. Não contiuemos a ouvir este tiroteio de amabilidades. Não queremos ser cruéis em abusar da superioridade de uma vitória incontestável. Os protestantes honestos e sinceros
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75. Erl. XXXII, 404.

76. Ap. AUDIN, Histoire de Calvin, II, 373-4; I, 269.



77. ZWINGLI, Opera, VIII, 165.


78. Ap. GRISAR, Luther, II, 229.

79. Ap. GRISAR, 1.c.


80. Ap. AUDIN, Vie de Calvin, II, 374; I, 270. Aí vêm indicadas as fontes contemporâneas.

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cobrem o rosto de pejo ante este espetáculo que os acabrunha. Mas a vergonha é salutar, a confusão é o começo de resipiscência. Se ainda lhes não embotou de todo na consciência o senso cristão respondam lealmente: é possível que Deus, para reformar o cristianismo e reconduzi-lo à sua pureza primitiva, tenha por instrumentos estes abortos de teratologia moral?81
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81. Bibliografia, AUDIN, Histoire de la vie, des ouvrages et des doctrines de Calvin, 2 vls. Paria, 2841; AUDIN, Histoire de la vie des écrits et des doctrines de Martin Luther(5), 3 vols., Paris, 18435-46; F. BICHILER, Luther in vergangenheit und Gegenwart, Regensburg u. Wien, 1918; CRISTIANI, Luther et le lathéranisme, Paris, 1908; H. DENIFLE, Luther und Luthertum, 2 vols., Mainz 1904-09; K. GERMANUS, Reformatorenbilder, Freiburg, 1, B; 1883, pp. 55-113; H. GRISAR, Luther, 3 vols., Freiburg 1. B. 1912; A. M. WERS, Lutherpsychologie als Schiüssel zur Luterligende, Mainz, 1906. Ver Nota 1, da p. 205.

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